Fascínio e projeto
Categoria: Ciências Sociais Aplicadas
Autor(es): Antonio Luiz Macêdo e Silva Filho
Editora: Edições UFC
Páginas: 202
ISBN: 978-85-7485-233-1
Ano: 2015
URI no Repositório Institucional da UFC:
http://www.repositorio.ufc.br/bitstream/riufc/16667/1/2015_liv_almsilvafilho.pdf
Resumo
Na mesa vizinha à nossa, duas damas revelam, cheias do mais justo orgulho, certas despesas domésticas. Dona Mariinha – Maricota quando pobre – ressalta com calor: – Lá em casa, este mês, pagamos trinta contos de luz! Já é, não é?” (CARVALHO, 2003, p. 383). Essa anotação, feita no diário de uma personagem do romance Aldeota, de Jáder de Carvalho, tenta pôr a nu a frivolidade de uma ge- ração de novos-ricos que, entre meados dos anos 1940 e o começo dos anos 1960, deu ao bairro que intitula o livro a notoriedade elegante que doravante o destacaria na geografia simbólica de Fortaleza. Atraindo a predileção dos segmentos abastados como lugar de moradia, aquela re- gião da cidade viu surgirem mansões e casas opulentas que ostentavam uma prosperidade repentina e estranha a uma terra relativamente pobre, desprovida de grande expressão econômica no cenário nacional. Saído da pena de um jornalista e escritor singularmente atento à miudeza da vida cotidiana e às desigualdades materiais e culturais, o fragmento re- ferido pode aludir a um aspecto nunca efetivamente comentado nos cír- culos que frequentavam os clubes de maior projeção social. No entanto, talvez fosse precipitado recusar prontamente sua capacidade de veros- similhança num contexto assinalado pela ascensão vertiginosa de grupos arrivistas e a diversificação no perfil do consumo residencial de eletricidade. Por sinal, a assim chamada “conta de luz”, que a persis- tência de certas expressões corriqueiras fazia reportar à primeira apli- cação daquele potencial no âmbito doméstico, tendeu a ser suplemen- tada com o emprego de aparelhos elétricos postos ao alcance das famílias abastadas da cidade. Com efeito, naquele momento o valor exorbitante de uma fatura de energia constituía não somente um feito limitado a poucos bolsos, era também uma condição algo improvável do ponto de vista técnico, dada a fragilidade do sistema elétrico municipal, que impunha recorrentes suspensões e regimes de racionamento na distribuição da energia.